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Entre o Preconceito e a Realidade: o que existe além do rótulo da proteção veicular

  • Foto do escritor: Eduardo Dada
    Eduardo Dada
  • 17 de dez.
  • 9 min de leitura
Entre o Preconceito e a Realidade

Falar sobre proteção veicular, no Brasil, quase sempre começa do lugar errado. O debate costuma ser raso, carregado de rótulos e, muitas vezes, conduzido por quem nunca colocou a mão na operação, nunca sentiu o peso de um sinistro relevante no caixa do mês seguinte e nunca precisou olhar um associado nos olhos para explicar uma decisão difícil.


Para quem observa de fora, a proteção veicular é frequentemente reduzida a uma caricatura: um modelo improvisado, barato demais para ser sustentável, mal governado e fadado a problemas. Esse discurso se espalhou com força e, em parte, ele existe porque erros reais foram cometidos ao longo do caminho. Negar isso seria desonesto.


Mas existe uma distância enorme entre o que se diz sobre a proteção veicular e o que de fato acontece dentro dela. Uma distância que só é perceptível para quem viveu o dia a dia da operação, lidou com rateio, negociou com oficinas, enfrentou fraude, suportou pressão de caixa e assumiu, pessoalmente, as consequências de cada decisão tomada.


Este artigo não é uma defesa da proteção veicular. É uma tentativa de revelar camadas que raramente aparecem no debate público. Camadas que ajudam a entender por que esse modelo existiu, por que ele se sustentou por tanto tempo e, principalmente, por que ele carrega aprendizados que o mercado segurador tradicional faria bem em observar com menos preconceito e mais curiosidade.


Ao longo dos próximos tópicos, vou explorar alguns desses pontos a partir de uma lógica simples: aquilo que todos acham que sabem, aquilo que só quem viveu esse universo realmente entende e o que isso significa na prática para quem pensa o futuro do setor.


O sentimento de dono: vício ou virtude operacional?

O que todos sabem ou acham que sabem


É amplamente difundido, tanto no mercado segurador quanto no discurso crítico sobre a proteção veicular, que o chamado sentimento de dono dos presidentes e dirigentes de associações é um dos grandes males do modelo. Esse apego excessivo à entidade costuma ser associado a práticas negativas, como desvio de recursos que deveriam estar reservados para indenizações, ausência de zelo com auditorias contábeis e fiscais, decisões personalistas e uma confusão perigosa entre patrimônio pessoal e institucional.


Esse argumento é conhecido, repetido e, em muitos casos, verdadeiro. Ele se tornou quase um consenso quando se fala em proteção veicular. E não por acaso, há um histórico real de erros que ajudaram a consolidar essa percepção.


O que só quem viveu esse universo consegue enxergar


Mas quem já viveu por dentro esse ambiente consegue enxergar uma camada que raramente aparece no debate. O mesmo sentimento de dono que, mal conduzido, gera distorções, também é o que viabiliza muitas operações na prática.


Esse dirigente, muitas vezes chamado pejorativamente de dono-presidente, é o mesmo que negocia pessoalmente com fornecedores de mão de obra, acompanha o veículo na oficina, discute cada detalhe de um orçamento e briga por R$ 10,00 de desconto na compra de um para-choque. É aquele que, diante de um furto, perde noites de sono acompanhando o rastreamento, falando com a polícia e tentando recuperar o bem, porque sabe exatamente o impacto que aquele sinistro terá no rateio do mês seguinte.


Não se trata de romantizar o excesso de centralização, mas de reconhecer que há ali um nível de responsabilidade direta que não pode ser ignorado. Não existe terceirização emocional da decisão. O erro dói no caixa, na reputação e, muitas vezes, no nome pessoal de quem está à frente.


O que isso significa na prática


Na prática, esse sentimento de dono gera operações que conseguem se sustentar justamente porque não terceirizam responsabilidades. São estruturas com barriga no balcão, olho no olho com o associado, decisões rápidas e uma gestão profundamente conectada à realidade financeira do negócio.


É evidente que esse modelo tem limites. Quanto maior a operação, mais difícil se torna manter esse grau de proximidade e controle pessoal. O que funciona bem em escala pequena ou média começa a exigir institucionalização, processos e governança mais robusta.


Mas ignorar que muitas associações só sobreviveram por anos graças a esse senso de posse e responsabilidade direta é não entender a raiz do fenômeno. Mais do que um desvio, o sentimento de dono foi, em muitos casos, o que manteve a operação viva.

Minha opinião direta: esse é o ponto que mais incomoda o mercado, justamente porque expõe uma virtude onde muitos só enxergam defeito.


Preço baixo é sinônimo de irresponsabilidade?

O que todos sabem ou acham que sabem


Quando se fala em proteção veicular, o primeiro argumento costuma ser o preço. A leitura dominante é simples e direta: se é muito mais barato do que o seguro tradicional, algo está errado. O valor reduzido é visto como prova de fragilidade técnica, ausência de cálculo atuarial adequado ou, no limite, irresponsabilidade na gestão do risco.


Esse raciocínio se espalhou com facilidade e ganhou força porque, de fato, muitas operações não resistiram ao tempo. Quebraram, atrasaram indenizações ou desapareceram. Para quem observa de fora, o preço baixo virou sinônimo de promessa insustentável.


O que só quem viveu esse universo consegue enxergar


Quem viveu a operação por dentro sabe que o preço menor nem sempre nasce da imprudência, mas de uma lógica estrutural diferente. A proteção veicular opera, historicamente, com estruturas muito mais enxutas, decisões rápidas, pouca intermediação e quase nenhum custo político ou comercial.


Não há grandes comissões, campanhas publicitárias milionárias, redes extensas de corretores ou estruturas nacionais pesadas. Há negociação direta com fornecedores, controle diário de despesas e uma obsessão permanente pelo caixa, porque qualquer desequilíbrio aparece imediatamente no rateio do mês seguinte.


Essa pressão constante faz com que cada real seja disputado. O preço baixo, nesse contexto, muitas vezes é consequência de eficiência forçada, não de irresponsabilidade planejada.


O que isso significa na prática


Na prática, esse modelo permite que operações sobrevivam por longos períodos sem capital externo, sem aporte de investidores e sem acesso a resseguro. Elas se mantêm de pé porque ajustam preço, cobertura e custo quase em tempo real, sentindo o impacto direto das decisões no resultado coletivo.


O problema não está no preço baixo em si, mas na ilusão de que ele pode ser mantido indefinidamente sem estrutura, capital e evolução institucional. Em determinado momento, a eficiência operacional deixa de ser suficiente. É exatamente nesse ponto que o modelo precisa mudar.


Esse novo momento exige a transição de uma lógica puramente reativa para um modelo de provisão, pautado em critérios atuariais claros. Não mais apenas reagir ao sinistro do mês seguinte, mas constituir reservas técnicas compatíveis com o risco assumido, projetar cenários adversos e precificar levando em conta frequência, severidade e capital necessário para suportar volatilidade.


Preço baixo sustenta o começo. Sustentabilidade exige maturidade técnica. Ignorar essa transição, ou adiá-la indefinidamente, foi o ponto de ruptura de muitas operações.

Minha opinião direta: o mercado erra ao tratar preço baixo como pecado. O erro real está em não reconhecer que chega um momento em que eficiência precisa dar lugar à provisão, e intuição precisa ceder espaço ao cálculo atuarial.


Governança inexistente ou governança diferente?

O que todos sabem ou acham que sabem


O senso comum afirma que a proteção veicular simplesmente não possui governança. A narrativa dominante é a de que se trata de um ambiente sem controles, sem prestação de contas, sem compliance e sem qualquer preocupação real com transparência ou estrutura institucional.


Essa leitura, mais uma vez, não surgiu do nada. Casos de má gestão, fraudes, ausência de auditorias e confusão patrimonial alimentaram esse discurso e deram munição para críticas duras vindas do mercado segurador tradicional.


O que só quem viveu esse universo consegue enxergar


Quem esteve dentro da operação sabe que, na maioria das vezes, o que existe não é ausência de governança, mas um modelo de governança informal, concentrado e profundamente personalista.


As decisões não passam por conselhos estruturados, comitês técnicos ou processos formais. Elas passam por pessoas. Pessoas que conhecem o caixa, os associados, os fornecedores e os riscos quase de forma intuitiva. É uma governança baseada em proximidade, reputação e responsabilidade direta, não em manuais.


Esse modelo é frágil do ponto de vista institucional, mas extremamente ágil. Resolve problemas rápido, corta custos sem burocracia e responde ao associado com velocidade. Funciona enquanto a operação cabe na cabeça e no controle de quem a conduz.


O que isso significa na prática


Na prática, esse tipo de governança funciona bem em operações pequenas e médias, onde a proximidade ainda é possível. O problema surge quando há crescimento sem transição. Quando a operação escala, mas a governança permanece dependente de uma única figura.

Nesse ponto, o risco não está na proteção veicular em si, mas na incapacidade de evoluir o modelo. A governança personalista deixa de ser virtude e passa a ser gargalo.


Minha opinião direta: demonizar esse modelo é fácil. Difícil é reconhecer que ele foi funcional em determinado estágio e que o verdadeiro desafio sempre foi saber a hora de institucionalizar sem destruir o que funcionava.


Associado não é cliente. E isso muda tudo

O que todos sabem ou acham que sabem


Para quem observa de fora, a relação entre associação de proteção veicular e associado parece confusa, pouco profissional e excessivamente emocional. A crítica mais comum é que essa proximidade prejudica a tomada de decisão técnica e cria precedentes perigosos, abrindo espaço para favorecimentos, conflitos e decisões inconsistentes.


Na lógica tradicional do mercado de seguros, a distância institucional entre empresa e cliente é vista como virtude. Ela protege processos, padroniza decisões e reduz riscos jurídicos. A proteção veicular, nesse olhar, estaria fazendo exatamente o oposto.


O que só quem viveu esse universo consegue enxergar


Quem viveu esse universo sabe que o associado não se comporta como cliente. Ele cobra como dono, questiona como fiscal e reage como parte do coletivo. Essa relação é, sim, mais intensa e mais difícil, mas também mais transparente.


O dirigente não decide escondido atrás de uma apólice ou de uma cláusula genérica. Ele decide olhando para quem paga o rateio, sabendo que qualquer escolha terá impacto direto na confiança daquele grupo. A cobrança é imediata, pessoal e constante.


Essa proximidade gera pressão, mas também gera responsabilidade real. Não há espaço para decisões abstratas ou desconectadas da realidade do associado. A reputação da operação não é institucional, é pessoal.


O que isso significa na prática


Na prática, essa relação reduz judicialização, incentiva negociação direta e acelera soluções. Problemas são resolvidos no diálogo antes de virarem processos. Ajustes são feitos no coletivo, com explicações claras sobre limites e consequências.


O custo disso é alto. Exige presença, disponibilidade e disposição para o confronto. Mas o benefício é uma operação viva, onde o risco é compreendido, compartilhado e, muitas vezes, aceito de forma mais madura.


Minha opinião direta: o mercado trata essa proximidade como amadorismo, quando na verdade ela revela um nível de exposição que poucas estruturas corporativas aceitariam sustentar.


Onde a proteção veicular falha e por quê

O que todos sabem ou acham que sabem


O discurso mais comum é que a proteção veicular falha porque é, em essência, um modelo errado. Que os problemas seriam consequência natural de informalidade, falta de regulação ou até má-fé estrutural. Nessa leitura, o colapso de algumas operações seria apenas questão de tempo.


Essa explicação é confortável, porque simplifica um fenômeno complexo e evita discutir as reais causas dos fracassos.


O que só quem viveu esse universo consegue enxergar


Quem viveu esse universo sabe que a maioria das falhas não nasce do conceito, mas da execução. O problema central costuma ser crescimento sem estrutura, aumento de risco sem capital correspondente e manutenção de um modelo personalista além do ponto em que ele é viável.


Muitas operações deram certo por anos, até o momento em que escalaram sem rever governança, preço, cobertura e capacidade financeira. O erro não foi existir, foi não evoluir.

A proteção veicular não colapsa por ser próxima do associado ou por operar com eficiência extrema. Ela colapsa quando confunde agilidade com improviso permanente.


O que isso significa na prática


Na prática, isso revela que o modelo tem um teto. Um limite claro de maturidade. Ultrapassá-lo exige escolhas difíceis, como abrir mão de controle absoluto, institucionalizar decisões, aceitar regras mais rígidas e, principalmente, mudar a forma de capitalização do risco.

Ignorar esse ponto de inflexão é repetir erros conhecidos.


Minha opinião direta: a maior falha da proteção veicular foi não reconhecer que seu próprio sucesso exigiria, em algum momento, uma transformação profunda.


Quando evoluir deixa de ser opção


Depois de viver intensamente o universo da proteção veicular, ficou claro para mim que o maior erro do debate não está em apontar falhas, mas em ignorar aprendizados. A proteção veicular não surgiu por acaso, não cresceu por engano e não se sustentou por sorte. Ela existiu porque resolveu problemas reais de forma eficiente, próxima e responsável, especialmente onde o mercado tradicional não chegava ou não queria chegar.


Ao mesmo tempo, também ficou evidente que esse modelo carrega limites claros. Limites de escala, de capital, de governança e de sucessão. Em determinado momento, insistir na lógica original deixa de ser virtude e passa a ser risco. Evoluir, então, não é uma concessão ao sistema, é uma necessidade de sobrevivência.


Esse ponto de inflexão, que antes era uma escolha estratégica, hoje passa a ser também uma exigência objetiva. Com a entrada em vigor da Lei Complementar nº 213, esses limites deixam de ser apenas percebidos pela prática e passam a ser formalmente estabelecidos. A lei impõe critérios claros de estrutura, capitalização, governança e responsabilidade, tornando obrigatório aquilo que, por muito tempo, foi tratado como opcional.


Foi a partir dessa compreensão que escolhi trilhar um caminho diferente do tradicional. Um cooperativismo que não nega a essência da proteção veicular, mas a organiza. Que preserva o sentimento de dono, a proximidade com o associado, a eficiência operacional e a responsabilidade direta, ao mesmo tempo em que corrige seus pontos mais frágeis por meio de estrutura, método e governança.


Nesse contexto, a Uniseg surge não como ruptura, mas como resposta. Um formato que auxilia justamente onde a proteção veicular mais sofre: na institucionalização da governança, na separação clara de papéis e na criação de mecanismos coletivos de controle, suporte técnico e visão de longo prazo, agora alinhados às exigências trazidas pela LC 213. Não para engessar a operação, mas para permitir que ela continue existindo de forma sustentável e em conformidade.


O que escolhi construir não é um meio-termo confortável, mas uma síntese madura. Um modelo que aprende com a prática, respeita a realidade de quem esteve na linha de frente e transforma experiência empírica em estrutura perene. Para mim, esse é o verdadeiro avanço: não repetir erros, mas também não desperdiçar virtudes.


Minha opinião final é simples. O futuro do setor não passa por negar o passado, mas por organizá-lo. E, com a LC 213, esse caminho deixa de ser apenas desejável e passa a ser inevitável.

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